A economia do conhecimento: O ser humano será dispensável?

Já não é mais nenhuma novidade dizer que o trabalho mudou. Também, nenhum ineditismo de se reconhecer que as relações de trabalho mudam paralelamente ao próprio capitalismo. Ora como causa, ora como efeito, o fato é que capital e trabalho convivem, em desarmonia (ou harmonicamente às vezes) desde um tempo que não é possível claramente precisar. Esse imbricamento tendencialmente conflituoso está em constante mutação, de tal sorte que, não se consegue pensar no amanhã a partir de critérios presentes, tampouco consegue-se pensar em uma sociedade, cuja forma de trabalhar permaneça estática. Basta lembrar como se deu a Revolução Industrial, o período das duas grandes guerras, bem como o pós-guerra, para se perceber como a velocidade desta mudança foi acelerada.

Se, no decorrer do Século XX, o processo ocorrido nas relações laborais foi muito rápido, o que há de se dizer com o início do Século que o sucedeu? Em que pese seja difícil definir seu início, a Revolução Tecnológica (ou agora denominada de digital) tem provocado alterações em todas as searas da vida humana. Obviamente, isso produz natural angústia, uma vez que não se consegue acompanhá-la, sequer denominá-la adequadamente e, muito menos, imaginar para aonde levarão os caminhos ora trilhados, mesmo que alguns visionários assim o façam, com todos os riscos lhes são inerentes.

Em tempos recentes, criou-se relativa convicção que se está a viver no campo econômico – com reflexos em todos os aspectos da vida humana – o surgimento da denominada economia do conhecimento, aquela que está a mudar tudo que até o momento foi construído pelo homem, sem quaisquer limitações de possibilidades futuras. Uma economia baseada no conhecimento, afirmam David e Foray, é aquela que investe no capital humano e no capital social. Relaciona-se, pois, a uma economia que estimula a capacidade de inventar e inovar para gerar novos conhecimentos e promover ideias que se transformam em produtos, processos e organizações capazes de promover o desenvolvimento, a fim de criar bem-estar e resolver as dificuldades econômicas na sociedade (2002, p. 472). Ou pelo menos deveria ser.

Na nova economia, a tradicional dicotomia “capital e trabalho” é superada e não constitui o problema central da geração de riqueza. Certamente, capital e trabalho são necessários para a produção de bens, mas o conhecimento é a base ou essência da economia. Se fosse necessário encontrar uma palavra-chave para economia do conhecimento, entre as mais merecedoras desta escolha, provavelmente o termo “inovação” despontaria com natural proeminência, indicando os rumos a serem perseguidos.

Quando se diz que se está a rumar, significa reconhecer a grandiosidade do que ainda está por vir, pois entre a tantas “coisas”, em relação as quais não é possível saber, estão os contornos definitivos dessa verdadeira “obra sem autor” (ou com múltiplos autores), nem quando será possível dizer que estará acabada, muitíssimo menos quando haverá de ser superada. Vive-se, pois, uma transição e como tal, se está a viver algo, essencialmente, inacabado. Ao invés de parecer insuficiente, isso se mostra devidamente estimulante aos seus múltiplos autores, em face à possibilidade de imaginá-la e livremente erigi-la. Eis o grande desafio!

Justamente por se referir a algo em construção, há de se levar em consideração a ressalva de Mangabeira Unger, segundo o qual a economia do conhecimento ainda se apresenta, hoje, “sob forma limitada de ilhas e franjas que ocupa nos distintos setores da economia”. Em vista disso, “somos tentados a identificá-la com sua expressão mais familiar: a indústria de alta tecnologia” e isso estaria restrito a “um pequeno grupo de megaempresas globais e por um segmento adjacente de empresas emergentes.” 

O trabalhador típico do Século XX, remanescente ainda, principalmente nas economias não desenvolvidas, foi “posto a trabalhar como se fosse mais uma de suas máquinas mimetizando seus movimentos repetitivos ou suplementando-os com atividades diferentes, mas analogamente formulaicas” (UNGER, 2018, p. 47).

Em vista disso, o desafio que se apresenta é que a economia do conhecimento possa romper com as amarras que até o momento fizeram-na se moldar-se em franjas insulares, beneficiando apenas aos grandes conglomerados e algumas pessoas que foram exitosas na tarefa de usufruírem – quase exclusivamente para si – os benefícios da nova organização da economia.

Se este caminho for buscado, o ser humano continuará a ocupar o espaço central neste processo. É certo, que máquinas podem ser melhores que os homens para a execução de tarefas repetitivas, porém jamais poderão substituí-los em relação à capacidade de imaginar, de descobrir, ou seja, na criatividade transgressiva e visionária, que são imprescindíveis à denominada Economia do Conhecimento.  Para comprovar isso, basta fazer o seguinte exercício mental distópico: suponhamos que o ser humano deixe de existir e a Terra seja dominada, exclusivamente, por máquinas. Como seria o planeta azul daqui a duzentos anos? Provavelmente, igual ao que é hoje, pois a máquina (por mais sofisticada que seja) consegue apenas reproduzir, mas não imaginar, transgredir. Enfim, tudo indica que nesta nova era, não obstante a reconhecida importância da tecnologia, o ser humano continuará a desempenhar o papel principal e as máquinas continuarão na condição de coadjuvantes, dentro do extraordinariamente enredo que vem sendo construído por múltiplos autores. Este, pois, é o espaço da esperança!

Marciano Buffon – OAB/RS 34.668
Advogado da equipe Buffon, Furlan & Bassani Advogados Associados – Assessoria Jurídica do SINDIMETAL RS, na área Tributária.
Artigo publicado no Espaço SINDIMETAL 81

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